segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

19. Apreensões

Sozinho num buraco. O portão abre e fecha enquanto ninguém olha. Todos os meus pertences íntimos numa caixa, em cima do muro. O avião decola na vertical e passa rasante por prédios e bosques. Enganando aos outros mas sobretudo a mim mesmo. Uma lista de coisas que saltam do papel e vivem. Sonhar com palavras e dizer a si mesmo, em sonho, Sonho com palavras, incessantemente. Acordar e só poder dizer isso, que sonho com palavras. Cortinas esverdeadas que se movem como pernas de gente. Dançar num local reservado para andar e ser preso por isso. Fumar cigarros embebidos em mel. Uma festa, ninguém aparece, é a sua festa. Súbito o seu melhor amigo de garganta cortada. Não mais festa, prisão ou sala de aula. Alguém decorou cento e cinquenta nomes de uma lista. Os nomes saltam, são pessoas, enchem a sala. O portão enquanto isso abre e fecha sem que ninguém veja. Mais tarde saberá disso por terceiros e não se perguntará como sabem disso. Tudo é natural se tudo acontece. Se pode ser imaginado naturalmente. Medo da onisciência. Pensar como inseto. Falar arrastado e de trás para frente. Não falar mais. Alguém responde a perguntas que não fiz e assim temos um diálogo. Não mais sozinho, não mais num buraco. Tomar a bênção a cobras. Andando pela sala como se estivessem vendo. Escurecer.

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