terça-feira, 8 de novembro de 2011

4. Os canalhas


Os canalhas estão chegando. Vestem roupas leves e são profissionalmente habilitados. Vêm numa velocidade estonteante. Carregam consigo objetos adaptados a suas funções específicas, lá de acordo com suas aptidões. Que abundância de funções. É muito talento numa turba só. O chefe deles parece vestir um terno, porém a impressão não subsiste a uma análise mais detida. Trata-se na verdade de bermudas pretas muito justas e meias-calças pretas cobrindo as pernas até os joelhos, o tronco revestido por uma espécie de manto preto de gola V sobre camisa pólo branca. É talvez um sacerdote. Atrás do chefe vem um aglomerado heterogêneo de quinze canalhas carregando itens em sacolas. As sacolas têm tamanhos variados. Sua função simbólica é evidente, embora não para mim. Para mim, podem ser só sacolas mesmo. Os quinze canalhas atravessam a rua revelando atrás de si um único canalha mirrado, os olhos colocados na terra. Muito já se falou sobre ele. Trata-se do médico, pois um estetoscópio enfeita o pescoço encurvado. Ele desaparece no meio de uma multidão de aproximadamente trezentos canalhas que vem vindo aí, cem ou cento e dois metros distante do chefe. Este é o povo, percebe-se pela magreza e expansividade dos gestos não obstante os frequentes cutucões dos capatazes. Estes contam três. Têm oito braços e são felizes, pois são sádicos. E atrás do povo, contornando os buracos do pavimento com a ajuda de réguas e polígrafos, os profissionais liberais tentam adivinhar onde estão os ricos e colocá-los em buracos para poderem comer a comida deles. Os canalhas chegam ao ponto determinado em conferência prévia, reduzem o passo, param, permanecem assim por quinze minutos e vão embora.

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